Faz algum tempo, eu e a Bernardette Amaral começamos uma conversa em comentários aqui no I&V, sobre o romance O Cantor de Tango, do escritor argentino Tomás Eloy Martinez. Eu tinha ótimas recomendações do livro, mas não tinha conseguido encontrá-lo para comprar no pouco tempo que tinha passado em Buenos Aires logo após o cruzeiro pela Patagônia, e não queria ler a versão traduzida. Pois não é que a Bernardette, que é de uma gentileza sem igual, buscou o livro para mim quando voltou a Bs.As. e me trouxe de presente? Li o romance com o maior carinho e ele correspondeu totalmente às minhas expectativas.
Passado mais algum tempo, em 2013, quando a Camila Navarro bolou o Projeto 198 Livros (que eu expliquei aqui no I&V também na página A VAM dos Livros) e a Argentina foi sorteada, me lembrei do romance imediatamente. As meninas toparam a sugestão, e O Cantor de Tango se tornou oficialmente o livro da Argentina no projeto. O romance se passa quase em sua totalidade em Buenos Aires e um dos cenários mais marcantes é o pequeno bairro residencial de ruas concêntricas, o Parque Chas, onde dizem ser impossível a um estranho não se perder. Devo dizer que não fui a única a ficar curiosa – em nossas conversas sobre o romance, o tal bairro e sua atmosfera misteriosa sempre vinha à baila…
Demorei mais de 2 anos para retornar a Buenos Aires depois dessa leitura, mas o Parque Chas ainda ocupava o topo da minha lista de prioridades na cidade. Fomos até lá uma tarde durante a semana, e foi um passeio agradabilíssimo. Tomamos a linha B do metrô até a Estação Los Incas – Parque Chas, um trajeto de cerca de 20 minutos a partir do centro.
Uma curta caminhada, não mais que 5 minutos, nos leva até uma das entradas do bairro, o ponto de encontro entre a Calle Cádiz e a Avenida de Los Incas. Seguimos pela Cádiz e depois pela Gandara, até chegar a uma pracinha.
Resolvemos enveredar pelas ruas circulares, para testar se seria mesmo impossível evitar se perder no labirinto do Parque Chas…
Não chegamos a nos perder no bairro, o que foi até um pouquinho frustrante… Acredito que de carro seja mais fácil perder o rumo, mas a pé não tivemos nenhuma dificuldade de localização. Seguimos ao longo de uma das ruas em toda a sua extensão, para ter aquela sensação gostosa de retornar ao ponto de partida.
As ruas do Parque Chas têm nomes de cidades europeias, sinalizadas em placas super bonitas – fotografei várias…
No centro do labirinto encontramos essa pequena fonte, com uma placa comemorativa dos 90 anos do Parque Chas. Dali começamos a refazer nossos passos para terminar nossa excursão com um bom café e a volta ao metrô.
O saldo da experiência foi bem interessante – visitamos um bairro que seria absolutamente comum não fosse pela forma como suas ruas são dispostas. Pelas ruas não vimos nenhum outro turista, apenas famílias saindo de casa em seus carros, mães levando crianças para brincar nas pracinhas, amigos tomando cerveja em barzinhos… Mas na minha imaginação eu estava imersa no cenário de Tomás Eloy Martinez, e isso fez toda a diferença…
“Sob a chuva, a cidade, espelhante de casario,
tem a esquisita sensualidade
da gata que se lambe e que se acaricia
Friorenta, lúbrica cidade.” (Olegário Maciel)
Nem me lembro mais quando aprendi de cor esses poucos versos de Olegário Maciel – mas eles sempre me vêm à cabeça nos dias nublados, frios e chuvosos, em geral tão pouco apreciados…
É fato que em dias de férias fica um pouco mais difícil curtir a beleza dos dias de chuva, uma das razões pelas quais eu sempre insisto que a pior coisa para quem está passeando é ter que obedecer a um roteiro “engessado”. Sou a favor de roteiros que apenas guiem, mas que possam ser modificados a todo instante, com espaço para desvios de rota, mudanças de ideia, descobertas de novos recantos e, claro, a ocasional chuvinha inoportuna… Um truque bastante conhecido e utilizado por aqueles que têm um pouco mais de experiência em viagens é guardar algumas atividades indoor para esses momentos – pode ser um restaurante onde se queira fazer uma refeição mais demorada, uma livraria bacana, cinema, teatro ou museus…
No nosso caso, fomos surpreendidos logo pela manhã por uma chuva que não parecia ter fim próximo – não era muita nem forte, pelo contrário, era fininha e insistente. Decidimos então que esse seria o dia dedicado a dois museus que tínhamos curiosidade de conhecer: o Museo Casa Carlos Gardel e o Museo Beatle.
O Museo Casa Carlos Gardel está situado na Calle Jean Jaurès, 735, em uma casa de fachada simples onde Gardel viveu com a mãe, na região conhecida como Abasto. Fomos de ônibus, que nesse caso era mais conveniente para nós do que o metrô. Tomamos o colectivo 75 na Calle Talcahuano, e em cerca de 20 minutos (apesar da chuva!) ele nos deixou na esquina de Tucumán com Pueyrredón. Caminhamos por algumas poucas quadras e logo chegamos ao museu.
Era o finalzinho da manhã, e o local estava super tranquilo. Fomos muito bem recebidos e fizemos a nossa visita com toda a calma do mundo – nos demoramos o quanto quisemos em cada um dos ambientes… Me pareceu que, embora o tema Gardel pudesse significar que o point seria obrigatório para turistas fãs de tango, na prática talvez ainda seja uma visita um pouco à margem do interesse mais geral – ou talvez a chuva tenha afugentado o público até mesmo dos museus…
Logo na primeira sala da casa-museu vimos fotos, partituras, documentos, discos e o lindo violão em lugar de destaque…
As primeiras salas foram uma baita viagem no tempo – chapéus, móveis, rádios, máquinas de escrever, um gramofone…
Mas em nenhum momento o museu virou as costas para a tecnologia, muito pelo contrário – pode-se passar um bom tempo ali apenas vendo os vídeos que contam a história do ídolo ou mostram suas apresentações…
Nas outras salas temos também muita informação sobre os músicos que trabalharam com Gardel, assim como um espaço reservado para as notícias da época de sua morte, em um acidente de avião que chocou não apenas a Argentina…
A última sala é um “mini-cinema” onde pode-se passar horas a fio vendo os filmes de Gardel…
Fizemos uma visita super agradável, até melhor do que eu esperava! Gostamos do trabalho de restauração / transformação da casa em museu, do cuidado com os objetos em exposição, da atenção dos funcionários do local. Assim, quando abri o Trip Advisor agora há pouco para conferir algumas resenhas sobre o lugar e me deparei com várias críticas negativas, achei uma grande injustiça – devo dizer que discordo veementemente!
Quando saímos do museu, já estávamos com uma fome daquelas… Mas ali bem pertinho fica o Abasto Shopping, que funciona no espaço que abrigava o antigo Mercado de Abasto. Recorremos à super praça de alimentação do shopping, lotada como de costume em qualquer shopping em um dia de chuva, mas que salvou a pátria…
Depois do almoço tomamos o metrô praticamente em frente ao shopping e seguimos para o segundo museu do dia, o Museo Beatle, situado dentro do Paseo La Plaza, na Avenida Corrientes 1660. O Paseo é um centro cultural, comercial e gastronômico super aconchegante, o que chega a ser surpreendente pela localização, em pleno frenesi da Avenida Corrientes. Dá pra escolher xeretar as lojinhas, pegar um cinema, assistir uma peça de teatro, conferir um restaurante…
… ou seguir até o Museo Beatle e fazer uma visitinha a essa que é considerada a maior coleção privada de memorabilia sobre os Beatles nas Américas…
Acho que a visita é bem interessante mesmo para aqueles que não são fãs da banda (mas não posso falar de cadeira – tanto eu quanto o marido amamos os Beatles… ) porque traz muitos objetos divertidos e curiosos, como por exemplo:
Ao final da visita, como já não estava mais chovendo, sentamos em uma das mesinhas ao ar livre do Cavern Club para um café que coroou mais um dia super gostoso em Buenos Aires.
Museo Casa Carlos Gardel
Calle Jean Jaurès 735 – Abasto
Ônibus: 26, 75, 132, 180
Metrô: Corrientes (linha H), Carlos Gardel ou Pueyrredón (linha B)
Horário de funcionamento: 2as., 4as., 5as. e 6as. das 11 às 18 h; sábados e domingos das 10 às 19 h; fechados às 3as.
Ingresso: as informações na web sobre o valor dos ingressos são muito desencontradas… Pagamos Ar$ 10 por pessoa em novembro de 2015.
Museo Beatle
Avenida Corrientes 1660 – Paseo La Plaza
Metrô: Callao ou Uruguay (linha B)
Horário de funcionamento: 2a. a 6a. das 10 às 24 h; sábados e domingos das 17 às 24 h
Ingresso: o site oficial não traz o valor atualizado das entradas… Pagamos Ar$ 40 por pessoa em novembro de 2015.
Nessa última viagem, ficamos hospedados em uma região da Recoleta onde eu nunca havia me hospedado antes – as cercanias da Plaza Libertad. Olhando no mapa, a região faz a fronteira entre a Recoleta e o Centro, o que pode dar a ideia (equivocada…) de que se trata de um “limbo”, uma “terra de ninguém”. Pois eu fui agradavelmente surpreendida.
Em primeiro lugar, amei o fato de estar situada praticamente ao lado de duas vias importantíssimas da cidade (a Avenida Santa Fé, na Recoleta, e a Avenida 9 de Julio, no Centro), sem sofrer as desvantagens dessa proximidade – nosso hotel, o Americas Towers, ficava na Calle Libertad, que é muito mais tranquila. Ao mesmo tempo, caminhando meia quadra em direção à Recoleta chegávamos à Santa Fé com todas as suas facilidades – lojas, cafés, ônibus… E, apenas virando a esquina e caminhando uma única quadra, caíamos em plena 9 de Julio. Fomos mais de uma vez ao Centro da cidade (principalmente para fazer câmbio…) a pé mesmo, rapidinho e sem nenhum problema.
Nossos passeios começaram e/ou terminaram várias vezes pela Plaza Libertad, esse oásis que nem parece que tem uma de suas saídas desembocando diretamente na Avenida 9 de Julio…
A igreja abaixo, Nuestra Señora de las Victorias, fica na esquina da Calle Paraguay com Libertad, em um dos cantos da praça…
Em outro canto da praça, na esquina de Libertad com Marcelo T. de Alvear, fica o Café Torre Paris, onde fizemos mais de uma refeição – nada especial ou rebuscado, mas comidinha caseira bem honesta a preços justos, além de empanadas muito saborosas!
Como estávamos mais perto do Centro do que de costume, um dia fomos caminhando ao longo da 9 de Julio em direção à Avenida Corrientes e as lojas de instrumentos musicais da Calle Talcahuano. Caminhamos olhando para cima de vez em quando, para não perder a beleza dos prédios antigos tão bem conservados como esse da foto abaixo, em frente ao Teatro Colón…
Mas, se a opção fosse por caminhar em direção a outro ponto do Centro, tomaríamos a Avenida Santa Fé e logo chegaríamos à linda Plaza San Martin…
A Plaza San Martin também fez parte de vários dos nossos passeios, principalmente quando precisávamos tomar o metrô – a Estação San Martin era uma das mais próximas para nós… Então, antes de entrar ou logo ao sair da estação, aproveitávamos para relaxar um pouco à sombra das árvores imensas…
… ou para turistar um pouco, admirando o lindo Edifício Kavanagh ou o Monumento a Los Caídos en Malvinas…
Ainda podíamos tomar uma terceira direção e chegar a pé até a região onde estão situadas as Embaixadas da França e do Brasil, a poucas quadras do Patio Bullrich, na Calle Posadas…
Enfim, foi uma ótima experiência! A região não conseguiu bater a minha localização predileta na Recoleta, que é o coração residencial do bairro, o quadrilátero formado por Vicente López, Azcuénaga, Arenales e Ayacucho. Mas não fez feio, e se mostrou uma excelente opção principalmente para os marinheiros de primeira viagem, que se beneficiariam da proximidade com o Centro para seus passeios turísticos!
Há pouco mais de 1 mês, passei 10 dias de férias com o marido em Buenos Aires. Já fazia mais de 3 anos que tínhamos ido à cidade pela última vez quando surgiu a oportunidade de matar as saudades… Demos a sorte de conseguir emitir passagens TAM com 10 mil milhas cada, ida e volta, em voos diretos – mas a maior sorte mesmo foi a que demos no aeroporto, quando ganhamos um upgrade gratuito e inesperado para a classe executiva! Como o nosso voo era curto, o ponto alto da classe executiva nem foi o conforto, mas sim a deliciosa sensação de usar talheres de verdade – tem coisa mais deprê do que comer com talheres de plástico?!?
Chegamos à cidade na véspera da eleição do novo presidente argentino, Mauricio Macri. Na prática, isso significa que ao longo dos nossos dias por lá ainda convivemos com a existência de dois câmbios, o oficial e o blue. Felizmente, uma das primeiras medidas de Macri como presidente foi unificar os câmbios, acabando com a chatice de ter que buscar uma cueva confiável para fazer um câmbio justo, e liberando o turista para voltar a trocar seus dólares ou reais a uma cotação decente logo na chegada, nas filiais do Banco Nación do Aeroparque ou do Aeroporto de Ezeiza.
Aqui vão então algumas impressões que tivemos ao longo dessa última viagem – e algumas dicas que podem ajudar a quem estiver planejando uma visita!
1. Transporte aeroporto / cidade
Nosso voo chegou à noite ao Aeroporto de Ezeiza, que fica a cerca de 1 hora da cidade de Buenos Aires propriamente dita. Nessas circunstâncias, eu nem penso em alternativas – me enfio no primeiro táxi… Nas últimas viagens a Bs.As., tenho usado o Taxi Ezeiza – o valor é justo e o serviço, bem decente. Conferindo no site agora, vi que o valor da corrida de Ezeiza ao Centro / Recoleta está em Ar$ 500, e eles oferecem a corrida de volta com desconto, a Ar$ 400. O guichê do Taxi Ezeiza fica logo em frente ao desembarque.
2. Hospedagem / localização
Eu gosto muito de ficar hospedada na Recoleta. O bairro é bastante residencial, super arborizado, tem prédios históricos lindos e comércio na medida certa. Escolhemos o hotel Americas Towers, situado na Calle Libertad bem pertinho da Avenida Santa Fé, uma das principais artérias comerciais do bairro. Foi a primeira vez em que me hospedei na vizinhança, e gostei – estávamos a uma distância perfeitamente caminhável tanto do coração da Recoleta quanto do Centro, e com acesso bem fácil tanto ao metrô quanto aos ônibus.
3. Transporte urbano
Usamos muito o transporte público dessa vez! Além da boa localização do nosso hotel, também descobrimos as facilidades do cartão SUBE (Sistema Único Boleto Electrónico). Pode-se comprar o cartão em qualquer kiosko (aquelas lojinhas que vendem balas, biscoitos, refrigerantes), ao custo de Ar$ 40, e carregá-lo com qualquer valor. Duas pessoas podem usar o mesmo cartão, não é necessário comprar mais de um. As passagens de ônibus, que, se pagas em espécie custam Ar$ 6, caem para Ar$ 3 com o uso do cartão. As passagens de metrô custam um pouquinho mais, Ar$ 4,50. Usamos nosso cartão até nos novíssimos trens urbanos que vão até Tigre, pagando Ar$ 3 pela passagem! (Para pesquisar os itinerários de ônibus, segue valendo a dica que dei nesse post aqui.)
4. Alimentação / preços
Não tem jeito: o café, o chá, a água mineral, os refrigerantes e os sorvetes são os grandes vilões dos custos das refeições em Buenos Aires… É possível fazer refeições bem legais a valores em conta, há menus executivos a custos razoáveis por toda a cidade – almoçamos a cerca de R$ 30 por pessoa em um café próximo do nosso hotel, com entrada, prato principal, sobremesa e taça de vinho.
Mas o bendito café nunca nos custou menos do que R$ 5 ou 6 (dependendo do lugar, poderia chegar a R$ 8!), chegamos a pagar quase R$ 10 por uma mera Coca-cola, e o sorvete no Freddo nos custou quase R$ 17 (mais caro do que no próprio Freddo aqui no Brasil!). Ah, sim, esses valores foram calculados ao câmbio blue 1R$ = 4 Ar$. A situação seria bem pior ao câmbio oficial da época…
De todo modo, conferimos que as empanadas do El Sanjuanino continuam uma delícia…
… as confeitarias continuam nos convidando a provar mil gostosuras…
… e é muito fácil encontrar um delicioso chá completo mesmo fora do circuito tradicional dos grandes hotéis!
5. Compras
As compras nunca foram o grande atrativo de Buenos Aires para mim. Sim, é verdade que em outras épocas já comprei ótimos casacos de couro, sobretudos de lã e blusas de cashmere a preços excelentes, roupas de cama de alta qualidade a uma fração ínfima do preço aqui, dermocosméticos e maquiagem também a preços muito convidativos. A oferta era tão rica que mesmo quem não estava em busca de compras não conseguia resistir. Pois bem, por ora essa fase acabou. Cheguei a ver camisetas de malha de qualidade bem duvidosa nas vitrines da Avenida Santa Fé custando o equivalente a R$ 200. Ou seja, nem é necessário deixar aquele espaço extra na malinha – não está valendo a pena… Nem mesmo livros comprei dessa vez, achei tudo bem caro mesmo. E nossos passeios pelas lojas de instrumentos musicais da Calle Talcahuano renderam comentários do marido no sentido de que há muitos modelos de violões e guitarras diferentes dos que encontramos no Brasil, mas o preço está alto demais para valer a pena passar o perrengue de trazê-los…
6. Alguns passeios diferentes
Dois veteranos em Buenos Aires sem nenhuma obrigação turística a cumprir e oito dias completos pela frente para aproveitar da maneira que nos desse na telha – pois bem, caminhamos muito, passamos muitos momentos tranquilos relaxando nos parques e cafés, repetimos alguns passeios amados e fomos desbravar alguns recantos desconhecidos. Deixo algumas fotos pra dar um gostinho do que virá nos posts seguintes!
O ano de 2015 foi atípico para o Idas & Vindas. Desde que comecei a escrever o blog, no início de 2007, uma das características mais marcantes do I&V é que ele se desenvolve em slow motion, em ritmo de novela – ou quase de soap opera, aqueles novelões americanos que se arrastam por anos a fio… Mas uma coisa é ter um ou dois posts mensais, e outra bem diferente é ter um ano inteiro de silêncio e um blog caladinho, quase em estado de coma…
O silêncio sepulcral do I&V não foi (apenas) uma escolha própria. Ao longo de 2014 o I&V sofreu várias invasões de hackers que deixaram a casa de pernas pro ar – foi algo inacreditável, parecia que estávamos atraindo mais invasores que o Pentágono. A cada episódio, lá ia eu dar trabalho à “dupla dinâmica” Cláudia Catherine e Roney Belhassof, que, com uma mistura de boa vontade, competência e sensatez, sempre conseguiu resolver os pepinos – meu muito obrigada aos dois! Mas, para debelar os problemas de vez, foi importante deixar o blog quietinho um tempo.
A sensação que eu tenho agora aqui no I&V é que estou arrumando a casa depois de um tsunami, furacão, terremoto, qualquer coisa assim catastrófica. Os backups ajudaram muito, mas ainda tenho muitos e muitos posts desconfigurados que preciso consertar a mão, palavra por palavra. Está dando um trabalhão, mas estou aproveitando para rever links quebrados, inserir tags, atualizar uma coisa ou outra… e, ao mesmo tempo, vou repensando o próprio I&V.
Outro dia, por ocasião do post comemorativo dos 8 anos do Viaggiando, eu deixei um comentário para a Camila que já era, em parte, o produto dessas reflexões que tenho feito a respeito da própria identidade e do propósito do I&V. O I&V é um pouquinho mais antigo do que o Viaggiando, vai completar 9 anos no início do próximo mês de fevereiro. Como a maior parte dos blogs de viagem que sobreviveu desde essa época, já passou por redefinições e reestruturações, mudanças de template, de domínio, de identidade visual.
Alguns blogs daquela época se tornaram a principal atividade dos seus autores, deixaram de ser lazer para virar trabalho – outros, como o I&V, embora também deem bastante trabalho, seguem como um hobby. Um hobby, por definição, é uma atividade que se pratica por prazer e diversão no (pouco) tempo livre de que dispomos, normalmente para relaxar das pressões do dia-a-dia – e um hobby dificilmente tem fins lucrativos, costuma gerar mais despesas do que receita…
Não nego que é muito difícil, para uma pessoa perfeccionista como eu, admitir que não é humanamente possível fazer do I&V o blog mais lindo e maravilhoso do universo, religiosamente atualizado dia sim e outro também. Não era possível quando eu fazia doutorado, continuou não sendo quando comecei a orientar mestrado e sei que não será possível no futuro próximo, quando, aos dois doutorados que já oriento se somarão mais três… Nesse momento, eu repito para mim mesma o mantra de que esse é o meu hobby, essa é a minha forma de prolongar as minhas viagens indefinidamente e, além de tudo, de contribuir com os meus acertos e mancadas para que outras viagens (não só minhas, mas de todos que vierem buscar informações aqui) sejam cada vez melhores.
Vou copiar aqui o comentário que escrevi para a Camila, que resume bem essas ideias…
Eu compartilhava um pouco da sua ansiedade quanto a deixar o blog atualizado, e me frustrava ao ver o tanto de horas livres que sacrificava aparentemente sem ter retorno. Depois cheguei à conclusão que o nosso tipo de blog (aquele que não é o “trabalho de verdade” do autor) não deve ser fonte de angústia – é apenas um hobby, que deve ser curtido no seu momento de lazer, com a função de desestressar, não o oposto…
Eu mesma precisei botar o pé no freio no Idas & Vindas por uma série de motivos, dentre os quais uma invasão hacker que levou meses para ser resolvida e deixou a “casa” de pernas pro ar. Às vezes me parecia que o I&V estava atraindo mais invasores do que o Pentágono, rsrsrs… Pois não é que isso teve um lado bom? Serviu para ver que o blog me faz falta, sim, mas que eu posso viver sem ele. E, se for para mantê-lo, que eu mesma comande o ritmo, que a viagem seja amena.
Eu tenho viagens super antigas que ainda vou postar um dia, devagar, quando tiver tempo, quando isso me der prazer. Minha VAM está fazendo 5 anos, e eu não postei tudo. As informações não estão atualizadas há tempos, mas não vejo nenhum mal nisso… O que proponho escrever são relatos pessoais, pequenas crônicas, observações delineadas ao longo dos dias de viagem – e isso é mais ou menos o que você faz também. A pessoa interessada em atualizar a informação para usar em suas próprias viagens tem um milhão de sites à disposição para consultar. Mas quantos deles trazem realmente um texto pessoal, sensível e gostoso de ler? Com toda a sinceridade do mundo, são pouquíssimos os blogs que eu gosto de ler de verdade – a maioria é como quase tudo na Internet, um amontoado de trivialidades…
Enfim, siga em frente no seu ritmo confortável, fazendo do blog um diário de bordo, um álbum de recordações, um arquivo pessoal. Esses são os blogs inestimáveis, atemporais, insubstituíveis – e para esses não vejo morte à vista, não…
Assim será 2016 para o Idas & Vindas então – um diário de bordo, um álbum de recordações, mas, acima de tudo, um arquivo pessoal de crônicas de viagem que possam trazer dicas úteis e ensinar um pouco do que eu venho aprendendo ao longo dos anos a quem quiser montar suas próprias viagens. Já me questionei muito se valeria a pena relatar viagens que fiz há alguns anos, e cheguei à conclusão de que vale, sim, porque o processo de pesquisa e preparo de uma viagem pode até evoluir de acordo com a tecnologia, mas não muda no cerne…
Só pra dar um gostinho, vou fazer uma lista de viagens que estou “devendo”:
Pois é, a lista de “dívidas” chegou a me deixar agoniada agora…
Um ótimo 2016 repleto de paz, saúde, amor, felicidade e muitas viagens a todos!!!